segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Nascemos porque fomos convidados


      O primeiro chamado que recebemos de Deus é o chamado à vida. Conforme o profeta Jeremias: “Antes de formar você no ventre de sua mãe, eu o conheci; antes que você fosse dado à luz, eu o consagrei, para fazer de você profeta das nações (cf. Jr 1,5s).”
Nosso existir é uma constante batalha: a todo instante somos desafiados a dar respostas. Vocação é, antes de tudo, um chamado. Pelo que vimos e experimentamos, em todos os momentos da vida estamos sendo chamados: desde o início de nossa existência até seu final; da vida à morte; da infância à eternidade. Não há como fugir da dimensão vocacional: ela está em nós como a beleza da rosa que não se pode desprender da sua forma material de flor. Somos, por natureza, vocacionados, ou seja, chamados, predestinados a alguma coisa.
No terceiro domingo do mês de agosto, a Igreja celebra o Dia do Religioso e da Religiosa, o dia da Vida Consagrada. Esta é um dom de Deus para a Igreja e para a Humanidade. Consagrado quer dizer escolhido por Deus para pertencê-Lo totalmente e para ser instrumento de sua particular presença de Amor no mundo. É uma vocação que se realiza por obra do Espírito Santo, no seguimento radical de Cristo casto, pobre e obediente.
A vida religiosa consagrada é um dom do Espírito Santo, sendo, no mundo atual, um sinal de profecia. São homens e mulheres que, livre e espontaneamente, decidiram consagrar-se a Deus para estar no mundo. E é através da sua consagração religiosa que realizam a missão de anunciar a Boa Nova de Jesus Cristo, vivendo em fraternidade dentro do carisma específico. Portanto, se falamos que Deus é Amor, então somente Ele basta em nossa vida.
Toda vocação é um chamado que vem de Deus e, ao dar a resposta, todo vocacionado torna-se impregnado de responsabilidade para com Deus, pois foi Ele quem o chamou e o consagrou: “Antes mesmo de te modelar no ventre materno, eu te conheci; antes que saísse do seio, eu te consagrei. Eu te constituí profeta para as nações (cf: Jr 1,4-5)”.
Somos conclamados a proclamar os altos feitos do Senhor, segundo São Pedro (cf: 1Pd 2,9). Desse modo, compreendemo-nos “co-herdeiros de Cristo” e, portanto, consagrados, participantes por excelência não apenas dos seus sofrimentos, mas também da sua glória (cf: Rm 8,16 -17). Tal consagração não é senão pela verdade, que é a Palavra de Deus.
O vocacionado consagra-se a Deus e Ele joga o consagrado no mundo: Eles não pertencem ao mundo, como eu não pertenço ao mundo. Consagra-os com a verdade: a verdade é a tua palavra. Assim como tu me enviaste ao mundo, eu também os envio ao mundo. Em favor deles eu me consagro a fim de que também eles sejam consagrados com a verdade (cf: Jo 17,16 -18).” Estando no mundo sem ser do mundo, mas enviados a ele para, assim como Jesus, fazer brilhar a glória dos grandes feitos de Deus.
Há homens e mulheres na vida religiosa. Os homens podem ser clérigos ou irmãos. Assim, pode-se muito bem ser um consagrado sem ser um ministro ordenado. Há de se considerar que o ideal é voltar às origens, quando a vida religiosa nasceu leiga, tornando-se clérigo só em um segundo momento, no início da vida religiosa em que o profetismo tenha prevalência. E nisso, o religioso irmão e a religiosa podem ser profetas na Igreja hierarquizada.
O Concílio Vaticano II, no Decreto sobre a renovação da vida religiosa Perfectae caritatis, número 10, afirma: “A vida religiosa leiga, tanto masculina como feminina, constitui por si mesma um estado pleno de profissão dos conselhos evangélicos, confirmando tais religiosos em sua vocação e exortando-os a adaptarem as suas vidas às exigências atuais devido à importância maior que possuem para o ministério pastoral da Igreja.” Portanto, o Concílio reconhece a importância desta vocação no meio social e no mundo. A Lumen Gentium (43,44) segue o mesmo exemplo e defende: “pela constituição hierárquica da Igreja, esse estado de vida não é intermediário entre a condição dos clérigos e dos leigos e sim um dom peculiar na vida da Igreja e faz parte, indubitavelmente, de sua vida e de sua santidade”.
Como imitadores e seguidores de Cristo, exercem o sacerdócio comum pelo múnus apostólico adquirido no sacramento do Batismo e confirmado nos demais sacramentos que conferem a graça de serem sacerdotes, pastores e reis, fazendo parte do sacerdócio real de Cristo. São, portanto, habilitados a colaborar de perto com a Igreja particular, cooperando com o bispo diocesano no seu ministério pastoral, pois vivem a consagração “mais íntima”, radicados no Batismo e dedicados totalmente a Deus pela vivência dos conselhos evangélicos.
Podem, ainda, na vivência de tal consagração, “colaborar com a gestação de uma nova geração de cristãos discípulos e missionários de Jesus Cristo e de uma sociedade onde se respeite a justiça e a dignidade da pessoa humana, fazendo transparecer o rosto materno da Igreja”, de acordo com o pedido no Documento de Aparecida do Episcopado Latino Americano e do Caribe.
O religioso e a religiosa são chamados por Deus e reconhecidos pela Igreja. Portanto, é uma vocação especial plantada no coração do mundo. Vocação esta que precisa ser regada e cultivada com o carinho e o respeito devidos.
Que o Senhor conceda um coração bem aberto a seu Espírito, presente e atuante na história! Que suas propostas, Senhor, nos encontrem acordados e preparados para seguir seus caminhos, por mais desconcertantes que nos possam parecer. Seguir seus caminhos intermanete como frei, irmão consagrado.
Nossa vocação: responder aos chamados! Da vida à morte, do hoje ao amanhã... Somos animados e desafiados a responder, a dizer sim ou não às demandas das fases de nossa existência.
frei mauro alves da rosa, ofmcap.


sábado, 18 de agosto de 2012

Mensagem aos Consagrados e às Consagradas do Brasil

Amados, amadas de Deus, Irmãos e Irmãs de Vida Consagrada, Tenho Sede!
dom Pedro Brito Guimarães- presidente da Comissão para os Ministérios Ordenados e a Vida Consagrada
Nas Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora na Igreja no Brasil 2011 – 2015 encontramos o seguinte texto: “para uma Igreja comunidade de comunidades, é imprescindível o empenho por uma efetiva participação de todos nos destinos da comunidade, pela diversidade de carismas, serviços e ministérios. Para isso, faz-se necessário promover: (…) o carisma da vida consagrada, em suas dimensões apostólica e contemplativa, presente em fronteiras missionárias; inserida junto aos pobres; atuante no mundo da educação, da saúde, da ação social; orante em mosteiros e carmelos, comprometida a evangelizar por sua vida e missão” (DGAE 104,b).
Quando aprovamos este texto, lembramo-nos muito de vocês. E hoje, nós que fazemos a Comissão para os Ministérios Ordenados e a Vida Consagrada – PV-SAV, OSIB, CNP, CND, CRB, CNIS e SBE -, queremos unir-nos a vocês na comemoração do dia do consagrado e da consagrada, marcado na grade do mês vocacional, no dia 19 de agosto.
É nossa missão apoiar, promover, valorizar, cultivar, cuidar e animar os carismas e mistérios na Igreja, sobretudo os das pessoas de vida consagrada. A vida consagrada é comunhão, vista à luz da Santíssima Trindade. Comunhão em Deus é abertura e pericorese: o Pai está todo para o Filho; o Pai e o Filho estão todo para o Espírito Santo; e o Espírito, Senhor que dá a vida, procede do Pai e do Filho, e com o Pai e o Filho é adorado e glorificado: ele que falou pelos profetas. Esta abertura de uma pessoa divina a outra é o espelho da comunhão de vocês na vida consagrada. A confraternidade na vida consagrada é o espaço humano, habitado pela Santíssima Trindade. A vida consagrada é, portanto, um dos rastos concretos que a Trindade deixa na história para que os seres humanos possam sentir o encanto e a saudade da beleza divina.
Vocês, amados, amadas de Deus, fazem parte da melhor e da mais perfeita forma de rede de comunidades; e também pelos carismas, apostólicos e contemplativos, vocês vivem a plenitude e a absoluta pertença a Deus, na ação e na oração. Portanto, caros e caras, permitam-nos escolher entre tantos, com o perigo que comporta qualquer escolha, os dez sinais que, a nosso parecer, melhor se adaptam ao estilo de vida que vocês levam e que mais chamam a nossa atenção, nesta homenagem que fazemos a vocês:
01. Ficamos felizes por vocês nos ensinarem a viver a leveza das nossas pesadas e letárgicas instituições eclesiais. Ensinem-nos a aliviar os pesados fardos das nossas Igrejas.
02. Agradecemos a vocês apostarem no valor da profecia e na força do profetismo, hoje bastante escasseados, até a entrega da vida no martírio. Que o testemunho de vocês ajude a nossa Igreja a redescobrir o amor, a solidariedade, o serviço, a partilha e o dom da vida.
03. Somos gratos a vocês por viverem o dom da virgindade consagrada, através de corações indivisos, em meio a uma sociedade erotizada. Que vocês consigam quebrar as barreiras do erotismo, do egoísmo e do individualismo, tão presentes na sociedade atual, assumindo um novo e diferenciado modo de vida, pela prática da castidade para servir, mais de perto, ao Cristo Senhor, e testemunhar que somos cidadãos e cidadãs do infinito.
04. Bendizemos a Deus por nos revelar em vocês o rosto materno de Deus e da Igreja, no cuidado dos mais pequeninos, dos restos, dos sobrantes e dos últimos. Que todos vocês, consagrados e consagradas de vida apostólica, monástica ou contemplativa, e membros dos Institutos Seculares, assumem o compromisso de dedicar a vida ao serviço do Reino de Deus, servindo aos irmãos na prática da misericórdia e da solidariedade, na luta pela justiça e na vivência do amor fraterno.
05. Louvamos pelos votos públicos de pobreza, obediência e castidade, e pela visibilidade da vivência radical destes conselhos evangélicos. Que a vida e as suas ações pastorais façam transparecer, com um sorriso no canto da boca, o rosto materno de Deus, especialmente para com os pobres, excluídos e marginalizados da sociedade.
06. Agradecemos a vocês a mística de paixão pelo Reino, em tempos complexos. Vivemos num mundo agitado e superficial. E que, neste contexto, vocês, consagrados e consagradas, cultivem a oração interior através da leitura orante da Palavra de Deus.
07. Somos profundamente gratos a vocês pela compaixão para com os pobres e pelo alegre testemunho de que somente Deus basta para dar sentido à vida e preenchê-la de alegria e de significado. É esta paixão pelo Reino que permite a vocês ouvirem a voz de Deus, deixando-O falar em todos os recantos da existência.
08. Obrigado por vocês apostarem no discipulado missionário, indo além do mundo que nos rodeia, para além das fronteiras da fé. A missionariedade está escrita no coração mesmo de toda a forma de vida consagrada. Vocês de vida consagrada são missionárias por excelência. E, por isto, devem ajudar-nos a crescer na consciência e na cooperação missionárias. E que este estilo de vida deixe transparecer a presença e a pertença ao Deus vivo, mesmo que, muitas vezes, de formas silenciosas.
09. Louvamos e agradecemos os projetos comuns, parcerias, partilhas e socialização dos dons e dos bens, em vista da missão e da evangelização. Que vocês ajudem a Igreja a manter aceso o fogo e o ardor missionários. E que vocês cultivem, cada vez mais, o amor a Jesus, apaixonados por Ele, fortalecidos pelos sagrados alimentos da eucaristia e do Evangelho da vida.
10. Enfim, profundamente agradecidos por vocês serem o que são, independentemente do que vocês fazem. Agradecemos igualmente a vocês o dom da vida doada e consagrada, com os olhos fixosem Jesus Cristo. Quevocês nos ajudem a crer que nossa pátria é o céu e que, portanto, ninguém viva, aqui na terra, como se aqui tivesse morada permanente.
Que o Divino Espírito Santo, doador dos dons e carismas e mantenedor dos serviços e ministérios, continue soprando novos e fortes ventos para despertar e suscitar novas, boas e santas vocações à vida consagrada, para o bem da Igreja e da humanidade.
Deus abençoe a vocês todos e todas, derramando chuvas de vida e de graça e fecundando os jardins de suas existências.

“Amo a todos vocês no Cristo Jesus” (1Cor 16,24).
Com minha bênção,
Dom Pedro Brito Guimarães,
Arcebispo de Palmas e
Presidente da Comissão para os Ministérios Ordenados e a Vida Consagrada