domingo, 16 de outubro de 2011

A vocação do Irmão na sociedade de estabilidade e na sociedade de mudança*


            Que sociedade, que Igreja, que vida religiosa existiu antes da crise de identidade?

Estamos na sociedade de estabilidade todas as vezes que: admiramos a lua; o que ocorreu irá acontecer novamente; sempre que sabemos o que vai acontecer; predominância do espaço sobre o tempo: céu acima, inferno abaixo; o espaço não muda, mas o tempo passa; a sociedade tradicional é espacial; sob o Romano Pontífice; o pai para as coisas mais importantes e a mãe para as “secundárias”; tradição e autoridade: o mestre de noviços, o provincial, o Geral, o administrador; não que seja má ou boa é apenas de estabilidade.

            O valor da instituição: a instituição existe para durar, não quer mudar, se mudou é porque não havia outra possibilidade, faz-se tudo para continuar, como a vida. Nenhuma instituição decreta sua própria morte; por isso não há reforma estrutural; etc. Busca estável em todas as realidades: como vamos manter a obra? Neste modo de ver e entender, qual é a identidade do Irmão Consagrado e da Vida Religiosa?

            A sociedade nos cria e nós não a criamos, contudo há certos valores nessa sociedade que devem ser assimilados. Certa estabilidade é interessante e importante. O medo vem ao se perder a estabilidade. Então, que sociedade provocou a crise de identidade? A sociedade de mudança! Com o surgimento da máquina diminui o esforço físico muscular; o esforço dos sentidos; o esforço do cérebro. Isso tem consequências positivas e negativas: mesmo trabalhando menos se produz mais. O risco é ficarmos preguiçosos e não pensarmos.

            Apesar de tudo, na sociedade de mudança a tradição segue. Aprendemos a linguagem por tradição, mas antes a tradição valia por ela mesma; agora a subjetividade toma a tradição e a interpreta: isto serve e isto não serve. A tradição passa pela mediação da pessoa de modo que jogamos fora o que não nos interessa. A maior mudança da modernidade para a VR foi, portanto, a descoberta da autonomia.

Podemos agora nos perguntar: “Será que já saímos de uma sociedade de permanência para uma sociedade de mudança? Até que ponto é necessário fazê-lo?”



            Nasce, assim, na igreja um terceiro tipo de pessoa, não rechaça as leis, mas a faz passar por sua subjetividade, surge como consequência, um terceiro homem, nem piedoso, nem ateu. Não é o relativismo, mas a consciência profunda da responsabilidade dentro de sua cultura. Antes tudo estava discernido pelo superior e tinha que se obedecer. Hoje tem que ver o histórico existencial. A realidade se punha por ela mesma, era ela a vontade de Deus, agora a vontade de Deus está no cruzamento da ordem dos superiores e o histórico existencial. Esse entrelaçamento gera a interpretação pessoal da vontade do superior. A maneira humana de entender é interpretar.

            A uniformidade na formação, um único modelo na formação não é bem visto e assimilado, pois, a mudança não aceita a uniformidade, contudo convém manter o fundamental, isto é, viver na intimidade com Cristo, amar e se entregar com e em liberdade a exemplo de Jesus que se mostra não em sua autoridade, mas em sua liberdade.

            Parece, por fim, que a VR nos impede de dizer que sentimos prazer no que fazemos ou que sofremos na missão, uma vez que ela é marcada pela obediência. Não podemos viver uma vida sã sem prazer; o que acontece é que temos que ampliar o leque de prazer, pois muitas vezes se reduz ao prazer sexual.

“A vida é insuportavelmente bela, morre-se de tanto viver”.

São Leopoldo, 10 de outubro de 2011

Ir. Gabriel Schuh SJ.


*Partes da assessoria do P. João Batista Libâneo SJ. no I Seminário Latino-Americano de Jesuítas Irmãos, 2011.